Sobre Jogos e Roupas

Escrito por:

Lucas Andrade

Sabe quando sua amada para em todas as vitrines do Shopping Center olhando cada uma das roupas disponíveis e você lembra das toneladas de peças no guarda-roupa dela e, principalmente, quando ela diz furiosa e atrasada para o compromisso de vocês que não tem o que vestir? E você silenciosamente, aconselho, pensa na natureza indecifrável feminina? Soa familiar?

Então lembremos, meu caro amigo gamer,

dos dias de insanidade de preços baixos, descontos imperdíveis, insanos e temporários e pacotes promocionais exclusivos da Steam Summer Sale,


o paraíso e inferno anual das compras na maior loja de vendas online para jogos de computador. Que atire o primeiro cartão de crédito quem nunca fez cara de espanto ao encontrar aquele blockbuster do ano passado por menos de dez dólares ou aquele clássico mais antigo, com todos os mapas, pacotes e itens opcionais por menos de cinco dólares. Ou quem nunca quebrou sua própria promessa de ter comprado o último título e segundos depois leu a mensagem de agradecimento de compra. Ou quem nunca amaldiçoou sua placa de vídeo defasada e sofreu com as promoções sem nem ao mesmo poder jogar, mas sendo solidário ao consumismo alheio.

A vida do gamer é baseada em um eterno desequilíbrio.

Na pré-adolescência temos tempo de sobra, mas pouco dinheiro. Com o passar dos anos, temos dinheiro, mas quase nenhum tempo. Divida o tempo entre família, trabalho, uma pós-graduação, amigos. E se você compartilha seu interesse entre outros hobbies como cinema, séries, música, esportes, responda: quando você vai jogar aquilo tudo que você comprou?

Sou o primeiro a confessar meu crime! A quantidade de coisas que tenho para colocar em dia, digo em termos de entretenimento, pois compromissos pessoais e profissionais não podem esperar, é suficiente para que não precise comprar mais nada por alguns anos! Quando irei rever a série Lost na íntegra? Quando lerei novamente os cem exemplares de The Walking Dead? Quando ouvirei o Anel dos Nibelungos de Wagner mais uma vez? E estou citando obras já conhecidas por mim, porque merecem e precisam ser reapreciadas. Multiplique por mil as coisas novas que preciso ver, ler, ouvir, jogar etc. Mas isto não impediu mais algumas comprinhas no Summer Sale da semana passada. Lembra do tempo que você ouvia aquele disco do Pink Floyd todos os dias por meses ou xeretava cada centrímeto de Chrono Trigger? Não é desse tempo? Que pena! Então você já nasceu na era das experiências descartáveis.

 

Shogun 2 por 7,49? Droga, esse eu perdi!

Então você compra um título como Age of Empires III por um preço irrisório e que poderá consumir dezenas e dezenas de horas de atenção. No caso de muitos, não irá! Não temos essas dezenas de horas. Mesmo que você jogue um pouco, sua experiência será tão rasteira que nem irá arranhar a casca do projeto do jogo. Imagine completá-lo ou jogá-lo por uma segunda ou terceira vez. E um jogo desta complexidade merece. Será que realmente saiu barato colocando nesta perspectiva? Ele agora é mais um nome na sua biblioteca da Steam ao lado de tantos outros, esperando aquela época que você mentalmente anseia quando tudo será menos corrido.

Nos tempos de conteúdo digital, colecionamos ícones de jogos, discos, filmes. Compramos, muitas vezes, com a falsa sensação de que estamos alimentando nosso hobby que tanto nos faz bem.

Infelizmente, o prazer se esvai rápido, pois o produto não é verdadeiramente consumido, o que é consumido é o símbolo. E precisamos de uma nova compra para manter a ilusão. Nosso passatempo, na realidade, é comprar!

 

26 de julho de 2012 Escrito por: Lucas Andrade